[Degelo]
Elas apontavam para cima, como se fossem mãos suplicantes. O meu coração palpitava, o suor caia em minha fronte, a minha respiração parecia hesitar. Eu hesitava. Os últimos metros não foram nada em relação a todo o caminho que tive que percorrer até aqui. O cheiro dos pinheiros era o único aroma que me indicava uma conexão com a realidade.
Três dias trás eu estava presa.
Acorrentada em uma sala escura, repleta de mofo e com o cheiro insuportável de
carne apodrecida. O tempo passava e eu já não sabia se a putrefação era minha,
ou de alguém que ficara cativo ali antes de mim. De tempo em tempo, uma pequena
portinhola se abria, um copo de água e uma variedade de comidas estranhas eram
colocadas no chão. A escuridão tomava conta novamente e eu me arrastava para
encontrar a bandeja. Era metálica. Apesar de ter as pontas arredondadas, em
vários momentos eu pensei em usá-la para acabar com a minha vida. Com qualquer
vida que restasse naquele lugar. Mas, cansada, colocava ela novamente em frente
a portinhola.
Um dia a porta se abriu. Eu
juntei todas as minhas forças e corri! Corri como se a minha existência
dependesse daquele momento. Continuei correndo sem rumo. A luz me cegou, e, ao
retomar a minha capacidade de enxergar as cores, uma imensidão de verde
explodia ao meu redor. Longos troncos, folhas no chão e pinheiros que poderia
alcançar o céu. Talvez esse fosse o meu destino.
Um estrondo ecoou à minha
direita. Pouco tempo depois, uma explosão perto do meu tornozelo. Estouros por
todos os lados e a minha única energia era para correr. A cada fôlego que eu
tomada, sentia a vida se esvair. Meu peito ardia de tal maneira que eu não
aguentaria mais tempo. Mais um estouro. Dessa vez, uma pequena dor na
região do meu abdômen. Minha roupa estava encharcada, não sei se era de suor ou
de sangue, não tinha tempo para verificar. O único tempo que possuía era para
correr.
Não sei há quanto tempo tenho
corrido. Agora estou aqui, contemplando o outro lado do lago. Os pinheiros
parecem mãos suplicantes apontando para cima. O cheiro da mata agora me parece
cheiro de café. A neve derretendo me lembra a efemeridade da minha vida. A dor
está um pouco maior. Tomo coragem e olho para baixo. O verde agora se contrasta
com o vermelho. Cor de luta, cor de sonho, cor de sangue. Era sangue. Sangue
misturado com suor. Era sangue que estava escorrendo de mim e caindo na terra.
Deixei um pouco de mim nesse caminho, mas não me resta muito. Não me resta
tempo. Não me resta fôlego. Não me resta sangue. Eu escuto mais um estouro.
Tudo se apaga.
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